sábado, dezembro 02, 2006

TLEBS - a proposta de Salomão

Rui Tavares, no PÚBLICO de hoje, avança para uma sugestão salomónica como forma de resolver a disputa em torno da TLEBS, não sem primeiro ironizar sobre as evidentes dificuldades de comunicação dos linguistas :
  • "Ironicamente, os linguistas não são capazes de comunicar com a comunidade. Mas não lamentemos demasiado os académicos, que só têm de se queixar pelas suas culpas, principalmente quando a impotência desliza para o "não falem do que não sabem", como fez Maria Helena Mira Mateus. Os académicos têm de entender que, quando está em causa a generalização dos seus saberes, não só é natural como desejável que as pessoas acabem "falando do que não sabem". Ou falamos todos do que não sabemos, ou sucumbimos à ditadura tecnocrática - e se os especialistas querem ajudar ao debate a melhor maneira de o fazer não é exigir-lhe que termine."
Será isto um indicador das potencialidades pedagógicas da abordagem linguística na sala de aula de português, pôr os alunos a saber tudo sobre a língua, mas ironicamente, com dificuldades em comunicar, ao contrário do previsto, se bem que à imagem dos seus defensores?

Mas a nota fundamental não é essa, mas sim aquilo que já todos perceberam:
  • "Além de que, se os linguistas tivessem pensado no resultado final, teriam feito bem em trabalhar menos e não mais: a TLEBS desce efectivamente a um nível minucioso que, como se viu, atrapalhou mais do que ajudou. Se eu fosse linguista, teria especial cuidado com este particular, porque já se chegou ao ponto em que Vasco Graça Moura conseguiu convencer as pessoas de que o linguista é o inimigo da língua e abomina a literatura.
Conheço poucos professores de português que não reconheçam a necessidade de uma actualização da terminologia linguística (apesar de não conhecer nenhum que a tenha "pedido" ao ME, como já tem sido sugerido); o problema é mesmo esta TLEBS, que em vez de servir uma necessidade básica foi utilizada como instrumento político de tomada de poder pelos linguistas.

A proposta de divisão do português de Rui Tavares:
  • "De um lado, teríamos a Literatura, não só pelo benefício que dela resulta para a língua, mas reconhecendo a centralidade das letras na cultura universal. Os clássicos da literatura em Língua Portuguesa continuariam a ser o núcleo fundamental desta disciplina, mas tampouco há razão para excluir dela alguns clássicos fundamentais em tradução."
  • "Do outro lado, a Linguagem. Mais uma vez, o eixo central seria a Língua Portuguesa, mas não nos deteríamos aí. Desde os saberes clássicos com contributos pragmáticos - a retórica, a gramática e a dialéctica - à análise de discurso, à construção de argumentos e às distinções entre fonética, morfologia e sintaxe."
Consequências? Dividir para reinar, colocando em lados opostos ("de um lado (...) do loutro lado") a literatura e a linguagem (como se isso fosse possível ou desejável!).

Para os linguistas, sugestões destas servem perfeitamente os seus propósitos, na linha do que já conseguiram para o ensino secundário, em que empurraram a literatura para uma disciplina opcional, que nem sequer é necessária para entrar num curso de línguas e literaturas modernas, enquanto na disciplina de português se analisam regulamentos e se vão lendo textos dos média (vulgo ler as gordas dos jornais) e coisas tais, para chegarmos à legitimação pelo uso... Percebestes?

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