O meu livro de início de férias foi Blink!, de Malcom Gladwell. É um livro que fala sobre as decisões/avaliações que fazemos instantâneamente, "sem pensar".
O objectivo do livro é mostrar que o subconsciente não é só um lugar obscuro, onde colocamos aquilo que não temos a coragem de pensar conscientemente. É o subconsciente para além de Freud...
Quase todo o livro fala de um conjunto de experiências feitas por investigadores, que provam que existem decisões das quais não temos (quase) controle. Mais do que isso: muitas vezes as decisões ou avaliações feitas num piscar de olhos (Blink, em inglês), são melhores que as que duram meses ou anos...
Entre os capítulos do livro, chamou-me a atenção o capítulo "O Erro de Warren Harding". Este capítulo mostra-nos que nem tudo são rosas nas decisões feitas num piscar de olhos. Gladwell diz-nos que as avaliações feitas nos primeiros instantes de uma relação podem estar erradas, mas dificilmente saem-nos da cabeça. Mesmo que conscientemente mudemos a opininião sobre alguém, o primeiro pensamento que nos vem à cabeça quando ouvimos o nome da pessoa é aquele que tivémos no primeiro segundo do primeiro contacto com essa pessoa.
E o mesmo se passa com os preconceitos. O livro fala do Teste de Associação Implícita, ou IAT, que "mede" os nossos preconceitos em relação ao género ou etnia. O que é mais engraçado é que toda a gente tem maior facilidade em, por exemplo, associar "branco" a "bom" e "preto" a "mau", do que o contrário, o que mostra o racismo inconsciente de cada um. Mesmo o próprio Malcolm Gladwell, que é mestiço, ou os próprios afro-americanos têm esse resultado no teste.
Neste capítulo existem outros testes que mostram que se associa mulheres e pretos a menor inteligência do que homens brancos. E isto feito por pessoas que não são assumidamente racistas ou machistas... mas quando viram uma mulher ou um preto, todos os preconceitos vieram ao inconsciente.
E atenção: neste caso falava-se de raça e sexo, que são maneiras mais fáceis de distinguir as pessoas. No estanto, estas ideias imediatas que temos ao ver alguém estendem-se a outras características físicas, etárias ou comportamentais, e estão por vezes erradas.
Isto para dizer o seguinte (em relação à minha posição sobre os exames): quando eu falo na subjectividade que existe na avaliação feita por um professor ao longo do ano, falo disto. Destes preconceitos implícitos, involuntários e muitas vezes errados, que são cometidos em qualquer relação. Mas tudo isto é multiplicado numa relação professor-aluno. Porquê? Porque muitas vezes o professor e o aluno nunca conversaram fora da aula, ou seja, não existe reconhecimento da real personalidade e esforço da pessoa. O professor avalia por aquilo que vê, por aquilo que parece que vê, ou vislumbra, no meio da sala de aula.
Para qualquer professor que esteja a ler este post: lembrem-se do vosso ex-aluno Fábio (escolhi este nome aleatoriamente... espero que todos tenham tido alunos de nome Fábio...). Repararam na quantidade de informações e ideias que vos vieram à mente sobre esse aluno Fábio? Veio-vos logo à ideia que tipo de aluno era, que notas tinha, a sua participação na sala de aula, a sua postura e interesse etc etc etc... Se calhar não repararam, mas foi isso que aconteceu no vosso inconsciente e é isso que vos vem à cabeça quando corrigem o teste ou dão a nota a qualquer aluno.
Muitas vezes essa avaliação é injusta. Quando estes erros acontecem, são, na maioria das vezes, involuntários. Mas acontecem.
A vantagem do exame nacional é que o professor não sabe quem é o aluno. Não existe nada a atrapalhar a objectividade da avaliação (a não ser o tipo de letra, ou a maneira de escrever, mas isso não se compara com a chamada "avaliação contínua", em termos de subjectividade...).
E repito: o exame é a avaliação objectiva, e portanto deve avaliar a parte objectiva do que é ensinado na escola. Essa parte objectiva é, essencialmente, a matéria dada, os conhecimentos. Eu proponho exames a valer 50%, porque acho que 50% é o mínimo de conhecimentos objectivos que a escola deve ensinar. E já estou a ser muito liberal, pois atribuo 50% da nota às "outras competências"... Exames a valer 50% é mesmo o mínimo dos mínimos...
Blink! mostra-nos que o que nos fica de alguém é a avaliação feita nos primeiros segundos do contacto com a pessoa. E não podemos combater o que nos fica na cabeça. O que podemos combater é o que fica na pauta, que deve ser o mais justo e objectivo possível. Mais exames é mais objectividade e mais objectividade é mais justiça na atribuição de notas...
P.S.: Já agora: se quiserem fazer o teste IAT, façam-no aqui e descubram que são uns porcos racistas e sexistas...
quinta-feira, junho 28, 2007
Blink! e mais um argumento pró-exames
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10 comentários:
Eu bem que costumo dizer aos meus alunos: só têm uma oportunidade para criar uma boa primeira impressão...
Há muito a estudar sobre a subjectividade da correcção dos exames. Há quem diga informalmente que após ter corrigido 1/3 do exame, o corrector tem uma ideia feita sobre as capacidades do aluno, com base no tipo de resposta dada, estilo de resposta, etc. Essa impressão condiciona a correcção do resto do exame e o corrector "força" a correcção para ajustá-la às suas expectativas. Estranho animal que somos, criamos uma representação do outro a partir de quase nada, e não nos queremos decepcionar...
Estou com pouca paciência para testes de personalidaed hoje, já estou farto de papeladas e cruzinhas. De qualquer mamaneira, para descobrir tudo isso, basta olhar para o espelho ;-)
O IAT não é mais um teste de personalidade... é uma investigação muito perturbante da mente humana, feita pela Universidade de Harvard...
Quanto ao seu comment: ninguém pode negar que um exame é menos subjectivo que um teste onde o professor conhece o aluno. Isto é, objectivamente, um facto.
... "é, objectivamente, um facto."
O único facto objectivo é que o Baldassare passa avida a apostar no cavalo errado e, mesmo quando lhe apontam que o bicho é uma tartaruga, ele insiste que é um cavalo e que tem vitória garantida ... em último caso porque "estava a brincar" e que a corrida é de tartarugas com uma só concorrente.
Então para si a avaliação de um exame é mais subjectiva que a avaliação de um teste em que o professor sabe quem é o aluno... explique-me lá isso...
Você não tem argumentos, então, em último caso, põe-se a parvar com metáforas que já perderam a piada há muito tempo. Quer falar sobre educação? Tudo bem. Quer desconversar e insultar que há em si, então vá fazê-lo para outro sítio.
Da crença na objectividade:
http://ultimahora.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1298050
Quem vai à guerra, dá e leva.
[Não se esqueça de elucidar o pobre piadista
Se a máxima popular é também salazarista]
E nos testes há cá uma objectividade... ui!
Só se descobrem erros em exames porque só se examinam os exames e não a pouca vergonha que são os testes de alguns professores...
"E nos testes há cá uma objectividade... ui!"
Para o Baldassare é que a objectividade parece ser um cavalo de batalha (frase provavelmente proveniente do salazarismo). Dando, implicitamente de barato que em qualquer dos casos (exames ou testes) a objectividade é uma miragem, fico sem perceber onde está a montada do Baldassare.
Eu preocupar-me-ia com a ausência global de objectividade de todo o sistema de ensino.
O Baldassare está a preocupar-se que falta um parafuso no casco de um navio que mete água por ter sido atacado a torpedo.
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Avaliar objectivamente os conhecimentos parece-me essencial. É um cavalo de batalha que estou disposto a montar.
Como sabe, eu preocupo-me com muitas coisas relacionadas com a Educação, mas agora estou a falar de exames... noutras alturas falei de outras coisas, mas agora apetece-me falar de objectividade e exames...
"Avaliar objectivamente os conhecimentos parece-me essencial."
O Baldassare quer avaliar quanto corre um cavalo sem pernas.
Dá-lhe jeito?
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