domingo, janeiro 06, 2008

Luiz Pacheco (1925-2008)

(...)

O coro dos cornudos,
acompanhado por São Pedro em surdina,
entoa a moralidade, após ter limpado as últimas lagrimetas
e suspirando como só os cornudos sabem


XX
Mulher não queiras sabida
nem com vício desusado,
que podes perder a vida
na estafa de dar ao rabo.

XXI
Escolhe donzela discreta
com os três no seu lugar.
Examina-lhe bem a greta,
não te vá ela enganar...

XXII
E depois de veres o bicho
e as maneiras que tem
a funcionar a capricho,
já sabes se te convém.

XXIII
Mulher calma, é estimá-la
como a santa no altar.
Cabra douda, é rifá-la...
- Que não venhas cá parar.

XXIV
Este conselho te dão,
e não te levam dinheiro...
os cornudos que aqui estão
com São Pedro hospitaleiro.

XXV
Invejosos quase todos
dos conos que o mundo guarda.

Fazem mais um bocado de lamentação.
(Nota do autor: «Quase», porque entretanto brincavam uns com os outros.
«Rabolices!» )

Mas se fornicas a rodos
tua vinda aqui não tarda!


Recomeça a moralidade,
estilo estão verdes, não prestam. Alguns bêbados,
cornudos despeitados ou amargurados.
Vozes pastosas. Deve ler-se: viiinho... velhiiinho...


XXVI
Melhor que a mulher é o vinho
que faz esquecer a mulher...
que faz dum amor já velhinho
ressurgir novo prazer.

Finale, muito católico

XXVII
Assim termina o lamento
pois recordar é sofrer.
Ama e fode. É bom sustento!
E por nós reza um pater.


Luiz Pacheco, Coro de escánio e lamentações dos cornudos em volta de são pedro
in "Antologia de Poesia Portuguesa Erótica e Satírica"
Selecção, prefácio e notas de Natália Correia
Antígona/frenesi, 1999

1 comentário:

PECHENICA disse...

Uma grande perda!!!
Adorava o carisma deste grande homem!